Título: Consulta-Cruel
Classificação: livre
Gênero: Suspense
Sinopse: Mario sempre teria segredos fortes guardados para si e por isso precisava se consultar frequentemente com um psicólogo. No entanto, o que seu terapeuta não imaginava é que segredos fortes, se revelados, podem gerar consequências cruéis.
Consulta - Cruel
- Eu liguei muito preocupado para essa garota a fim de
perguntar se ela usou o anticoncepcional, sabe? Foi horrível como me senti.
Então ela contou que eu não precisava me preocupar, já estava tomando o
medicamento há 2 meses sem parar. De cara eu fiquei tão feliz!
O seu
confidente terapeuta franze a testa. Confusão mental na certa.
- Acho
que eu não compreendi. Vocês estão saindo há 2 semanas, não 2 meses, correto?
- Isso.
– A felicidade consumia o rosto pálido de Mario. – Significa que eu não devo
ser o único da vida dela. Que maravilhoso.
O
doutor faz cara de compreensão perto do que lhe parecera exótico naquele
momento.
-
Interessante. – Diz, roboticamente.
- Isso
não é tudo. – Mario fecha seu rosto de um modo inesperado e intrigante. – Na
verdade tem a parte ruim. Ela acabou me deixando bem claro... Só usava o
medicamento antes de me conhecer por conta dos problemas hormonais dela. Não é
por causa de homem. Significa que, como eu inicialmente não imaginava, eu devo
ser sim o único da vida dela. Isso é uma droga!
-
Entendo, eu acho. Você pode ser sincero com ela. Querer saber a verdade não
machuca ninguém, só impede uma decepção futura. Porém permita-me a pergunta...
Qual o motivo de desejar ser só mais um? Você não tinha dito nas outras sessões
o quanto era ela magnífica, que lhe desejava pelo resto de sua existência, que
nunca havia encontrado ninguém tão incrível quanto e o que mais mesmo? – O
doutor ri levemente enquanto encara Mário inclinando-se em sua direção,
pensando no resto. – Etc e tal, né? – Desiste de pensar, acomodando-se na
poltrona.
-
Exato. – Mario está pensativo olhando para baixo enquanto as mãos estão juntas
se mexendo, revelando tensão. – Mas as pessoas a quem eu me apego sempre...
sofrem... Eu não posso querer o mesmo para ela, entende?
-
Muitos momentos difíceis ultimamente?
-
Cansei. Não quero mais isso. Eu acabo sendo o que mais sofre. Te contei sobre o
que eu ando sentindo... Você sabe que está difícil. Eu sinto que não sou mais o
mesmo.
-
Realmente você disse que mudou. – O doutor confere se é verdade folheando suas
anotações de sessões passadas. – Mas nunca explicou como.
- Bem,
estão acontecendo coisas estranhas comigo. Esse é o problema. E o pior é que
nem você e nem ninguém vai poder ajudar. Você é um homem da ciência, vai ter
que ver para crer. E quando ver... vai desejar nunca ter passado por isso. No
fim todos morrem.
-
Sofrem.
- Não,
doutor. Eu disse “morrem” mesmo.
- Ver o
que? Mostre-me o que é.
Mario
finalmente levanta seus olhos e encara o doutor.
- Você
não crê em mim. No final eu sou só mais um lunático de mente fraca como
qualquer outro que você precisa sempre deixar confortável. E então o dinheiro
aparece depois. Muito fácil. Pior de tudo é isso... Como eu queria que fosse
exatamente isso. Como eu queria ser um merda no fim das contas.
O
terapeuta se surpreende com a atitude de Mario, sempre tão calmo.
- Não
precisa me alfinetar assim. Estamos no mesmo barco. Eu sou seu amigo. Conte-me
tudo. Sou seu ouvinte. E o que pudermos fazer para melhorar será feito.
O
doutor sempre fora tão bom com as palavras e como sempre tocava seu paciente
com elas, mas Mário estava longe de ser qualquer um. Não mais. Essas palavras o
incomodavam bastante no momento. Mário olha pela janela. A noite está brilhante
de tantas estrelas como um presente divino do acaso. A sorte estava lançada aos
céus. Momentos românticos ecoariam pela cidade por causa dessa noite e Mário
estava com saudades da sua amada.
- Vou
indo. Obrigado por tudo.
-
Mário, nosso tempo ainda não acabou.
- Nosso
tempo já era. Para sempre. Eu não volto mais. Cansei.
- Você
acha que eu não sou o bastante?
- Não,
doutor. – Mário deixa cair uma pequena lágrima do seu olho esquerdo. – Na
verdade você é o melhor. – Mário começa a tremer bem devagar. - É exatamente
por isso que devo partir. A cada sessão isso fica mais difícil. E você é muito
bom para passar por tudo isso. Não... você não.
-
Passar pelo que, filho? Por favor, eu juro... Quero mesmo te ajudar.
Enquanto
o doutor se aproxima de Mário, seu braço passa pela lateral da porta
enferrujada e se corta.
-
PORRA. Isso doeu. Espere, Mário, já volto. Fique aí. – O terapeuta vai correndo
até uma gaveta no banheiro e pega um Band-Aid a fim de colocar no braço. Ele
volta rapidamente. – Onde estávamos?
O susto
aparece quando é observado que Mário está suando frio, aparentemente sem ar,
passando mal.
-
Doutor, eu... sai...
-
Mário, o que está acontecendo? Meu deus, vou chamar um médico lá do andar de
cima.
-
DOUTOR! SOME DAQUI. SEU BRAÇO...! – O grito assusta. Um calafrio chega com
força perfurando a sua espinha rapidamente. Um sexto sentido acusando a
existência de algo tenebroso.
Ao
olhar para Mário, seus olhos estão vermelhos e seu grunhido irreconhecível, ou
som, ou, enfim, risada, talvez, encontra-se possuída. Sua pele está contida e
forçada acusando a existência de tantas veias que em alguns lugares até um
médico experiente poderia esquecer que existia. – Doutor, eu tentei... não
consigo mais. Sangue, cheiro. É bom... CORRE, PORRA! – Mário grita com uma voz
terrivelmente grossa e, ao avisar que ele deveria correr, paradoxalmente e
imediatamente avança em seu terapeuta que é logo abatido. A gritaria sonoriza o
prédio inteiro e as pessoas de outros locais se espantam tentando identificar o
que está havendo e onde.
O
doutor nunca gritara tanto em sua vida e provavelmente nem sentira tanta dor
como nesse momento. Mário está preso com seus dentes em seu pescoço, sugando
tudo que pode de seu terapeuta. É como se tivesse um ímã em seu pescoço e Mário
gosta de ímãs. O prazer é tão forte que um arrependimento é impossível, não até
se satisfazer por completo.
Mário
larga-o depois de sugar tudo. O doutor está pálido, sem vida, olhos arregalados
e boca aberta numa expressão geral muito sofrível. Fora uma morte dolorosa.
-
Porra, mais um... e logo ele. – Mário chora enquanto volta ao normal. Chora que
nem criança. Pega o doutor nos braços. – Não pode. Você não, você não, você
não. VOCÊ NÃO!
Ele se
limpa com o sangue escorrendo de seus lábios. Chega no espelho do banheiro e
passa a toalha. Mais um caso estranho para desvendarem na cidade. Mais um ato
cruel de Mário. Ninguém imagina que um estudante universitário de vida semi
solitária e um pouco pacata seja o responsável por esses crimes.
-
Helena. Eu preciso de você.
Mário
abre a janela e pula em direção a um beco escuro nessa noite tão bonita.
Ninguém o veria fazendo essa arte e que mal uma queda de 4 metros poderia
fazer? Ele estava pronto para Helena. Faria exatamente o que lhe foi ordenado. Seria
direto e honesto. Queria saber se ele era só mais um e se não o fosse mesmo,
teria que largá-la para sempre. Antes doer o coração do que, novamente, um novo
pescoço. Não suportaria ficar sem sua amada, mas matá-la seria ainda pior. A
próxima missão vai ser a mais difícil. Maldita doença. Ir contra o amor é quase
impossível, porém necessário.
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