Mês do terror: Eliza (parte 5 - final)




Título: Eliza
Classificação: +14
Gênero: Terror/Suspense
Sinopse: Todos conhecemos alguém como Eliza, uma pessoa que costuma ficar quieta em um canto, fazendo suas próprias coisas, como se estivesse à parte do mundo. Normalmente, pessoas assim são as vítimas preferidas dos valentões (e valentonas) na escola, mas também de quem menos se sabe a respeito. Algumas dessas histórias somem com o tempo, já outras, criam marcas que nunca serão esquecidas. Essa é a história de Eliza e você decide em que categoria ela se encaixa.


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5

“Os segundos pareciam se arrastar enquanto a angústia de Eliza só aumentava. Ao notar que não conseguiria se soltar daquela maca, apenas fechou os olhos e se concentrou nos sons externos. A medida que o tempo passava, a sirene ficava mais alta até que o som ecoou de forma ensurdecedora no galpão. Algum policial gritou do lado de fora, avisando que o local estava cercado e pedindo para saírem com as mãos para cima. Eliza apenas riu de desgosto daquela situação, a afobação dos policiais apenas expulsou a única criminosa que estava no local.
Flashes do que ela havia acabado de presenciar voltaram a sua mente e as imagens de pessoas sendo degoladas e dilaceradas fizeram com que lágrimas silenciosas começassem a escorrer pesadamente de seu rosto. A única coisa que a aterrorizava mais do que ser presa por tudo aquilo era a certeza de que seria morta por tudo aquilo... Eliza não tinha certeza no que dera em sua mãe, mas não conseguia mais reconhece-la por trás daquela máscara. A jovem conseguia ver a ironia do destino, sua mãe, a pessoa que a criou, havia se transformou na criatura que Eliza havia idealizado. De criadora da vida, ela assumira o papel de criatura assassina.
Após alguns minutos, que pareceram horas, Eliza finalmente ouviu uma porta se abrir e os policiais entrarem. Ainda de olhos fechados, Eliza soube identificar o momento exato em que eles se depararam com a chacina que havia ocorrido pela quantidade de palavrões e expressões de medo e angústia proferidas. A garota entrou em um dilema: fingir-se de morta até adormecer, entrando pela primeira vez no teatro que por tantas vezes assistira, ou contar a verdade para ser totalmente desacreditada e punida injustamente.
Ela não teve muito tempo para pensar, pois logo resolveram conferir o corpo amarrado no meio daquela cena grotesca e, quando Eliza abriu os olhos, ambos os policiais que estavam em cima dela levaram um susto. Teria sido cômico em outra situação, mas a garota estava extremamente tensa. Ela foi reconhecida por um deles, afinal estavam à procura dela mais cedo, porém, ao contrário do que a jovem pensava, levaram-na para fora como vítima e testemunha, não acusada.
Quando saiu do galpão, a jovem notou que não fazia ideia de onde estava e, se não fosse pelas luzes azuis e vermelhas das viaturas ao redor, provavelmente o lado de fora estaria no completo breu. Um dos policiais que a resgatou, conduziu Eliza até o seu pai, que a abraçou chorando pedindo perdão, todavia isso só deixou a garota mais confusa. Sentia como se tivesse recebendo informações a menos, como se faltassem peças de um quebra-cabeças para ele fazer sentido. Acompanhada de seu pai e do policial, Eliza foi levada para uma ambulância que estava ali perto, onde teve um atendimento inicial, contudo, ao receberem o depoimento da garota, decidiram leva-la para o hospital.
No momento em que as portas foram fechadas, Eliza se viu deitada em uma maca, imobilizada, encarando a luz da ambulância e cercada de pessoas. Então sua mente “quebrou”. A garota sentiu como se uma onda com todos acontecimentos e informações dos últimos dias desabasse em sua cabeça, seu estômago embrulhou e ela começou a vomitar água e chorar copiosamente, como se todo o líquido do seu corpo quisesse sair de uma vez com aquela enxurrada de informações. Os enfermeiros tentaram acalmá-la, porém ela só ficava mais nervosa a agitada, por isso tiveram que sedá-la. Nos últimos momentos de consciência de Eliza, ela viu as várias faces inclinadas sobre ela ficarem borradas e um último pensamento lúcido se passou pela sua cabeça “a única porta só fez barulho quando os policiais entraram, então sua mãe não tinha como ter saído antes”.
Ao abrir os olhos, Eliza se sentou de uma vez e notou que estava na cama do hospital. Sua respiração estava ofegante e, ao olhar para o lado, notou que seu pai estava adormecido em um sofá ali próximo. Ela desconectou todos os aparelhos que estavam em si e eles começaram a apitar. Notou, então que seu pai nem ao menos havia se mexido e seu coração começou a disparar. Sabia que, mesmo estando muito cansado, o estado de alerta deveria tê-lo acordado com aqueles sons. Então, cuidadosamente, Eliza caminhou até ele e, quando chegou perto ouviu uma voz atrás de si informando que ele havia tomado tranquilizantes.
Ao se virar, a jovem se sentiu aliviada por não ser sua mãe, ainda que achasse aquela enfermeira familiar. A mulher tentou persuadi-la a voltar para a cama, mas Eliza se negava e começou a ficar agitada e irritada com a persistência. Ouvindo a confusão, um policial entrou para ver o que estava acontecendo. A solução para acalmar a jovem, sugerida pela própria enfermeira, foi leva-la para dar uma volta pelo hospital e, ainda que o oficial parecesse reticente, diante o estado de nervos de Eliza, ele não impediu o passeio.
Uma sirene de alerta tocou no fundo da cabeça da jovem, que teve novamente a sensação de ter perdido algumas informações para entender a situação, mas Eliza se sentia incapaz de dizer o que era, então apenas acompanhou a enfermeira. Do lado de fora do quarto, tudo parecia normal, pacientes sendo atendidos, enfermeiros passando pelo corredor, médicos entrando em quartos e alguns policiais estavam por perto como se mandados para reforçar a segurança, o que parecia lógico mediante a situação. Por um momento, Eliza começou a se questionar se o que tinha acontecido a pouco não afetara seu senso de razão, mas ao entrar no elevador vazio com a enfermeira e começarem a subir os andares, permitiu-se continuar desconfiando.
A sirene em sua mente começou a tocar mais alto, pois Eliza tinha conhecimento de que, em situações como aquelas, o mais indicado seria levar o paciente para a área externa, que ficava no térreo, e a entrada de outra enfermeira, dois andares depois, não a deixou mais calma. A segunda enfermeira trajava todas as roupas necessárias para um procedimento cirúrgico e entrou com um carrinho no elevador, algo que, definitivamente, não era comum. Ao notar as duas se cumprimentando, Eliza apenas ficou mais alerta, preparando-se para sair correndo no instante em que a porta abrisse de novo. Contudo, não esperava que o elevador só fosse parar no último andar, onde uma parede de pessoas que entravam no elevador, querendo descer, atrapalhassem sua fuga.
A tentativa frustrada da garota tentar escapar da enfermeira apenas chamou mais a atenção da sua “guardiã”, que agora guiava a jovem pelo braço para um corredor vazio enquanto dizia que se Eliza soubesse o que ia acontecer, não só ficaria tranquila, mas feliz. Entretanto, as palavras vindas de uma mulher que segurava seu braço firmemente e a levava para um destino desconhecido soaram vazias para Eliza e seu único alívio foi saber que a outra enfermeira tinha seguido por um trajeto diferente. Após andarem por um bom tempo, elas finalmente entraram em uma sala vazia onde eram realizadas as radiografias. O ambiente estava totalmente gelado e as roupas finas de hospital que Eliza trajava não ajudavam em nada a aumentar a temperatura.
E enfermeira, sorridente, disse para ela ficar à vontade e apenas riu da desconfiança de Eliza. Algum tempo depois, enfermeira “camuflada” do elevador reapareceu e, quando ela tirou a máscara, a garota não ficou nenhum pouco surpresa ao ver sua mãe. Sua progenitora abraçou a enfermeira que levara Eliza até ali e agradeceu pelo favor. Naquele momento, a jovem lembrou de ter visto aquela mulher em fotos de formatura da sua mãe.
Pouco tempo depois, Eliza e sua mãe foram deixadas sozinhas na sala. A jovem viu sua progenitora a olhando como se tivesse com saudades de eras, mas ao primeiro movimento dela, Eliza apenas recuou para atrás da mesa de raio-X. A mãe da garota começou um discurso sobre não haver o que temer e sobre ter feito tudo por obrigação, e enquanto ouvia as justificativas sem sentido de sua mãe, a jovem só pensava em como conseguiria fugir dali.
Quando sua potencial assassina caminhou para a sala de controle do aparelho, Eliza olhou todos os cantos a procura de uma saída de emergência, contudo, antes que a jovem encontrasse sua rota de fuga, sua mãe voltou com um machado em uma mão e a máscara na outra. Nessa hora, a mãe de Eliza começou a falar em um tom extremamente triste sobre como aquelas mortes a assombravam, mas que não conseguiria parar até completar sua missão. A garota, ao ouviu sua genitora falando sobre como a “máscara” a obrigava a fazer aquilo, soube que não poderia argumentar com ela, pois a racionalidade e a razoabilidade haviam abandonado de vez aquela conversa.
Quando sua mãe colocou a máscara, Eliza não conseguia acreditar que era a mesma pessoa que estava falando havia pouco tempo. Toda a insegurança, o medo e até a sombra do afeto haviam em sua voz desapareceram por completo. As únicas coisas que aquela figura transmitia era a sede por punição. Eliza sabia melhor que ninguém, pois era assim que ela havia desenhado. Assumindo a personalidade fria e cruel daquela figura, a mãe de Eliza começou a caminhar até ela e, por um segundo, a jovem conseguiu se enxergar naquela criatura. Não pela maldade, mas pela inexpressividade. A máscara, apesar de carregar as más intensões, também trazia um vazio de expressão que Eliza usava constantemente para encarar a sua vida.
A garota, pela primeira vez, entendeu o porquê de ter desenhado aquela figura por tantos anos. Era apenas uma expressão de uma parte da própria Eliza. Uma representação do seu afastamento ao mesmo tempo que mostrava sua raiva. O homem com o machado sempre fora apenas mais um lado de Eliza e, por algum motivo, sua mãe resolvera assumir aquele papel. Porém, a coisa mais importante que a jovem percebeu foi que, mesmo sendo um lado dela, não precisaria ser o lado mais forte. Por isso, quando viu o machado vindo em sua direção, a garota desviou da lâmina e se jogou contra aquela figura, derrubando-a no chão. Era hora de Eliza enfrentar seu medo.
A reação de Eliza fez com que sua mãe derrubasse o machado no chão. A jovem se apressou em pegá-lo e correr com ele para o outro lado da mesa do exame, ficando do lado oposto à sua adversária. Ainda mascarada, a mulher encarou Eliza e tentou persuadi-la a devolver o machado, enquanto dava a volta na mesa. Na mesma velocidade, Eliza, encarando-a em silêncio, continuava contornando a mesa para se manter afastada de sua mãe. Já cansada da brincadeira de roda, a menina desceu a lâmina do machado sobre a mão estendida daquela criatura mascarada que ela já não reconhecia mais.
Sentindo a dor de ter sua mão arrancada, a progenitora de Eliza recuou apertando o braço sobre o corpo para conter o sangramento. Nesse momento a porta se abriu e, a enfermeira que esperava do lado de fora, ao ver a cena, saiu correndo e gritando. A mãe de Eliza, ignorando aquela situação, apenas encarou a filha com ódio e ressentimento e começou a xingá-la e humilhá-la. Como se tivesse se acostumando com a dor, começou a caminhar em direção a Eliza, que ainda estava em choque com o que havia feito, mas segurava o machado como se pudesse atacar novamente. Então sua mãe tirou a máscara e com o rosto distorcido pela loucura encarou a filha e ordenou que ela entregasse o machado, estendendo agora sua única mão.
Com o peso das suas memórias da época em que era educada, Eliza rapidamente entregou o artefato para sua mãe que, novamente armada, sorriu malignamente. Ela subiu a lâmina do machado e desceu novamente em direção a Eliza, que só teve tempo de fechar os olhos. No instante seguinte, a garota ouviu uma pequena explosão que ecoou na sala, seguida de um baque e um grito de dor. Ao abrir os olhos, Eliza viu um policial entrar com uma arma na mão e se abaixar ao lado oposto da mesa. Dando a volta, pode ver sua mãe caída no chão, sangrando não apena na mão direita, mas no ombro esquerdo.
A jovem foi incapaz de contabilizar quanto tempo passou até uma equipe médica levasse sua mãe dali. Ao deixar aquela sala, acompanhada pela polícia, Eliza olhou uma última vez para o machado com marcas de sangue e a máscara que, naquela correria, havia sido pisoteada e quebrada. Já de volta ao quarto, a jovem encontrou seu pai acordado. Os oficiais a interrogaram assim que ela se acomodou e, junto às demais provas que tinham, o testemunho de Eliza era o suficiente para prender sua mãe. Todavia, o desfecho foi bem diferente do imaginado. Algumas horas depois, Eliza recebeu a notícia que sua mãe não poderia ser presa, pois havia sido encontrada morta com um machado cravado em seu peito.

Após muita insistência, a jovem foi levada pela polícia para ver a cena e, ao se aproximar com receio do corpo inerte da sua mãe, uma coisa muito específica chamou a sua atenção. Em um dos lados do machado, que ainda jazia no peito da mulher, havia uma pequena frase escrita em letras de forma apressadas: ‘ela foi a primeira, não a última’”.



   Fim


Autora: Bruna Gonçalves

Idade: 23 anos

Localidade: Brasília



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