RESENHA - Quando ela desaparecer (Victor Bonini)



Ficha técnica
Referência bibliográfica: BONINI, Victor. Quando ela desaparecer. 1ª edição. São Paulo, Faro Editorial, 2019. 272 páginas;
Gênero: Suspense policial;
Temas: Investigação, jornalismo, assédio sexual, bullying;
Categoria: Literatura Nacional;
Ano de lançamento: 2019

“Oito pessoas desaparecem por hora no Brasil. Esse livro-reportagem é sobre uma dessas pessoas.”
*Quando ela desaparecer (pág. 09)

Em Quando ela desaparecer, vamos acompanhar as investigações sobre o desaparecimento de Kika, uma aluna de um colégio do bairro Cecap que sumiu durante um tradicional passeio escolar da Álvaro de Azevedo. O bairro onde todos acreditavam se conhecer bem foi mobilizado por meses pelas investigações policiais e suspeitas, pois segredos dos moradores investigados começam a ser revelados pela imprensa e mostram que os “cecapianos” não se conheciam tão bem quanto pensavam. Agora todos estão desconfiados até mesmo dos seus vizinhos mais antigos enquanto esperam descobrir o paradeiro da garota desaparecida e ver a justiça ser feita. Afinal, onde está Kika?


Assim que comecei a leitura, deparei-me com um estilo de escrita diferente do usual, isso porque o primeiro capítulo é uma carta da personagem Sarah, a “autora” do livro-reportagem que estamos prestes a ler sobre o caso de Kika. Ela explica que seu objetivo é contar todos os fatos, na ordem que foram divulgados na mídia, para reconstruir a história que parou o CECAP. Desde então, ela deixa claro que ela está diretamente envolvida com o caso e, por isso, em alguns momentos acabaria mostrando uma visão mais parcial da história, mesmo assim, não sabemos nesse primeiro momento o quanto ela está envolvida.
Depois da carta de Sarah, já somos apresentados aos primeiros fatos sobre Kika. Isso porque a história vai alternando entre acontecimentos de antes do desaparecimento, das investigações e pós a conclusão do caso. Dessa forma, vamos recebendo esses relatos como peças de quabra-cabeças, que vamos colocando em ordem na linha temporal até montarmos a história completa ao final do livro, como todo bom romance policial.
Esse foi o primeiro livro do Victor Bonini que li, e admito que faz algum tempo desde que li meu último livro de suspense policial, mas ainda assim achei a obra muito bem construída. A ideia da narrativa a partir de Sarah foi um diferencial que tornou a obra muito mais verossímil, principalmente com a citação de supostas manchetes e reportagens sobre o caso de jornais que conhecemos. Admito que durante a leitura, parei algumas vezes para tentar achar alguma Kika que desapareceu no Cecap pelo google.
Além disso, o final realmente me surpreendeu. E por final, digo o último parágrafo. Se você é uma das pessoas que gosta de espiar a última página, cuidado para não pegar um spoiler gigante com isso. Essa história teve tantos plots e a construção de Bonini foi tão bem feita que me remeta a um artesão que tece uma grande tapeçaria contando uma história. Durante a leitura, é como se vagássemos pela história tecida de um ângulo bem próximo e, somente ao final, contemplássemos a obra completa, percebendo como cada pedaço se encaixa perfeitamente em uma única e bem construída peça.
A narrativa ainda pode te deixar bastante reflexivo sobre algumas temáticas. Dentre estas, o bullying é o mais evidente, uma vez que Kika sofreu diversos tipos de agressão na escola. Contudo, não pude deixar de ver o machismo que estava por trás de alguns dos motivos que levavam a esses comportamentos por parte dos seus colegas. Essas questões chamaram tanto a atenção da Bruna Psicóloga que eu acabei fazendo um texto só sobre isso, e ele sairá em breve aqui no blog.
Quando ela desaparecer é leitura rápida, mesmo porque você fica curioso para saber o final e isso te faz ler ainda mais, porém tem alguns momentos do livro que precisei parar e processar o que estava ali, seja por ficar desacreditada ou indignada, afinal, existem algumas cenas que muitas pessoas podem achar bem fortes. Algumas vezes, parei apenas pela história me lembrar da minha época de escola, onde conheci uma garota que era tratada quase como a Kika, e admito que acho que ninguém está totalmente imune desses pensamentos, pois adolescentes são adolescentes em qualquer época e lugar.

“—Ela mereceu. A roupa dela, da Kika, você viu o tamanho do shortinho? Ela usa o mesmo desde o nono ano do ensino fundamental. Muito vaca”
*Quando ela desaparecer (pág. 35)

Como a narrativa é construída pela Sarah, ele é majoritariamente em terceira pessoa, porém existem alguns relatos em primeira pessoa de outros personagens e até mesmo da própria Sarah, que conta algumas memórias daquela época. A linha do tempo está sempre se alterna entre acontecimentos anteriores ao desaparecimento de Kika, acontecimentos da investigação e o que aconteceu após a conclusão do caso. Mesmo assim, esses fatos são bastante amarrados uns aos outros, portanto não interfere a fluidez da história.
Cabe dizer que a produção gráfica da Faro Editora contribuiu bastante para essa fluidez, já que as diferenças temporais também possuem cores de páginas diferentes, que se alternam entre “branco” (já que a impressão é em papel pólen, que é mais amarelado), cinza e preto. Além disso, a história conta com recortes de jornal durante a narrativa com as reportagens indicadas por Sarah, além de fotos e prints das redes sociais de eventos importantes para a histíoria.
Achei todos os personagens verossímeis (repito, eu procurei no google, minha gente). Mesmo que Victor Bonini precisasse inserir várias pessoas na narrativa, por se tratar de uma investigação, impedindo de que todos fossem trabalhando com profundidade, personagens de grande importância narrativa, como o delegado Cordelli e a mãe de Kika, tiveram suas características bem trabalhadas. Mesmo alguns personagens secundários teveram seus backgrounds explorado na narrativa, e foi algo tão interessante e ligado ao cenário principal da história que realmente foi possível visualizar o sentimento de comunidade do Cecap.




Victor Bonini nasceu em São Paulo, morou em Vinhedo, interior do estado, e voltou à capital aos dezoito anos para cursar jornalismo. Na adolescência, devorou todos os livros policiais e de terror que pôde encontrar. Na universidade, seu elogiado trabalho de conclusão de curso, em parceria com Mariana Janjácomo, foi um livro sobre o caso Pesseghini, apresentando vários aspectos do crime que chocou o país em 2013. O trabalho não foi publicado a pedido da família das vítimas. E aos vinte e dois anos, quando lançou seu primeiro livro, Colega de Quarto, pela Faro Editorial, ele finalmente entendeu que escrever é a forma de dar vazão a debates internos sobre a lógica de crimes e a mente dos psicopatas — pensamentos que o assombram como ideias para a ficção, querendo emergir. Atualmente é repórter da tv Globo, em São Paulo. Também publicou O Casamento pela Faro Editorial.
Se você gosta de histórias bem escritas e está procurando um novo suspense ou livro investigativo, adicione Quando ela desaparecer a sua lista. Também recomendo esse livro para quem gosta de histórias bem contextualizadas, afinal, por se passar no Brasil, ele traz uma realidade sobre nosso sistema policial, até com um quê de crítica. Por fim, recomendo para quem está começando a ler suspenses ou de histórias investigativas, ou mesmo quem está pensando em começar a ler esses gêneros, e procuram pela indicação de um bom título. Se você é uma dessas pessoas, não duvido que Quando ela desaparecer irá te agradar.



Bibliografia de Victor Bonini

Livros:


  • Colega de quarto – Faro Editorial (2015).
  • O Casamento – Faro Editorial (2017).
  • Quando ela desaparecer – Faro Editorial (2019)

Contos:

  •  Vozes do Joelma – Faro Editorial (2019)


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